No dia 31 de dezembro de 2022, o Jornal A Tribuna publicou uma matéria com a seguinte manchete: “Niterói não terá novos espigões”, garante Grael (link matéria).
A matéria traz uma entrevista do atual prefeito de Niterói, Axel Grael, e uma das perguntas feitas ao prefeito foi: A votação da Nova Lei Urbanística acabou ficando para 2023. Essa questão é envolta em muitas polêmicas, inclusive com o Ministério Público, interferindo no processo, com uma série de exigências. O que falta para ela ser aprovada? Resposta: “Falta cumprir o rito do Legislativo. O projeto é muito bom para a cidade, mas tem sido atacado com fake news, de que há “vários espigões”. Onde tem prédio mais alto é na pedreira de Jurujuba, porque isso já está na legislação vigente. Fora isso, são prédios de cinco, seis andares. Isso não é espigão em lugar nenhum. Falam que no entorno da Lagoa de Itaipu haverá isso. Está explícito que é garantida a faixa marginal de proteção. Estamos preparando mais um material explicativo sobre essas questões. Tenho certeza de que isso será esclarecido e será cumprido o rito, na Câmara de Vereadores. Teremos uma Nova Lei Urbanística, fechando o ciclo do que a cidade precisava. Quando assumimos, em 2013, havia um passivo de planejamento. O Plano Diretor de Niterói estava atrasado, em mais de dez anos. Nós fizemos, primeiramente, os Projetos Urbanísticos Regionais de Pendotiba, o plano diretor e, agora, a Lei Urbanística, que regulamenta o plano. O que está sendo colocado, agora, nela, é uma regulamentação do que já está no plano diretor. Fizemos audiências públicas, exaustivamente, em cada região do município, inclusive transmitidas ao vivo pela Internet. Tudo o que tinha de se fazer, foi feito.“
O prefeito fala que é fake news que o novo Projeto de Lei 161/2022 propõe espigões para a cidade. Por conta disso, seria importante alguns esclarecimentos por parte do Prefeito.
Afinal, ou o prefeito desconhece o projeto de lei que mandou para a Câmara sobre uso e ocupação do solo – o que torna evidente a importância da participação do prefeito nas audiências públicas, lembrando que não foi a nenhuma – ou, é má-fé.
As informações que parece ter obtido de seus subordinados faltam com a verdade. A leitura de espraiamento urbano feita pela Secretaria de Urbanismo é além de equivocada, tendenciosa não só ao erro, mas à manutenção de más condições de qualidade de vida para toda a população de Niterói.
Se a definição de espigão diz tratar-se de “edifício muito alto e com um grande número de andares, que destoa arquitetônica e urbanisticamente da zona envolvente”, mais do que a altura dos edifícios, a preocupação é com o aumento de população que o adensamento prevê, reflexo da construção de mais prédios, onde problemas atuais não estão na perspectiva efetiva de solução pela Prefeitura. Questões como falta de água, recurso inexistente na cidade, que já sofre cotidianamente com sua falta, agravada no verão, e a falta de mobilidade são pontos que afetam todas as classes sociais só com a população existente. Se aumentar o número de pessoas, problemas crônicos serão agravados, como drenagem, saneamento básico, coleta e destinação de resíduos, e o trânsito. Além disso, as pessoas mais pobres não estão contempladas no Projeto que não prevê vazios urbanos para construção de novas moradias, cerca de 37% estão hoje em assentamentos precários, e ainda prevê a gentrificação em áreas valorizadas já ocupadas há anos.
Vale lembrar que a previsão de aumento de gabarito na quadra da Praia de Piratininga de 4 pavimentos mais a cobertura para 7 andares, em um bairro sem saída, é muito preocupante.
Além desse exemplo, há inúmeros outros que avançam sobre os 15 andares na pedreira em Charitas, que, na verdade, podem ser 17, previstos sobre zona de amortecimento do Parque Municipal Natural de Niterói (PARNIT). Se a possibilidade já existente de construção de prédios de até 21 pavimentos na cidade não foi utilizada em 20 anos pelo mercado imobiliário, não é motivo, com as péssimas condições mencionadas, se perpetuar no erro e manter a permissão de maior expansão vertical da cidade.
Preocupa a população que tem estudado o projeto afirmações feitas pela Secretaria Municipal de Urbanismo (SMU), onde distorções como o mencionado espraiamento urbano, insistem na existência de plano de mobilidade, quando moradoras e moradores convivem cotidianamente com engarrafamentos e onde a Transoceânica, por exemplo, que no passado foi mencionada como a solução para a mobilidade de toda a cidade pelo então vice-prefeito Axel, no último ano teve como desculpa pelo seu péssimo funcionamento a baixa demanda, nas palavras do Secretário de Urbanismo.
Segundo o que consta para a Região Oceânica de Niterói no PL, prevê a liberação de gabarito de prédios para o entorno da Lagoa de Piratininga de 8 andares (+ 2 pavimentos de embasamento, totalizando 10 andares, imagem abaixo). Pergunta: qual a necessidade de aumentar o gabarito nessa região que sofre constantemente com caos no trânsito por conta da falta de espaço?
Qual Faixa Marginal de Proteção (FMP) que está garantida a proteção? A FMP da prefeitura ou a do decreto INEA? (imagem abaixo), até onde se sabe a que vale é a FMP do INEA (Decreto Nº 42.355/2010), porém no mapa apresentado pela Prefeitura a FMP é outra, onde propõe prédios de 6 andares (+ 2 pavimentos de embasamento).
Pergunta: O município pretende revogar um Decreto Estadual? Lembrando que o PL reforça, em seu Artigo 226 (inciso 4º) que a área de Camboinhas no entorno da lagoa, proposta como ZRA 6+ (Zona Residencial Ambiental com 6 andares + 2 de embasamento), vai até o limite da FMP da Lagoa de Itaipu, definida pelo órgão licenciador ambiental estadual. Alterar um decreto estadual que protege uma área úmida e altamente permeável, permitindo construir em solo permeável, destruir ecossistemas úmidos (banhado) e restinga, além de NÃO levar em consideração a questão climática, especialmente os cenários de aquecimento global (e elevação do nível do mar) dos últimos relatórios do IPCC parece no mínimo preocupante. E preocupa porque apesar da cidade ter uma Secretaria do Clima, o que demonstra importância pela pasta, pouco se vê no Projeto de Lei 161/2022 a respeito da contenção de tragédias climáticas, com mais carros circulando, por exemplo.
Imagem 1: Mapa apresentado pela Prefeitura de Niterói, no PL 161/2022, que mostra a proposta de gabarito de 8 andares (ZC–ZEIS+8), inclusive avançando sobre a FMP da Lagoa.
Imagem 2: Imagem retirada do PL 616/2022, onde mostra a FMP proposta pela Prefeitura de Niterói e a FMP do INEA que até o momento é a válida.
Por isso, reitera-se que o Projeto de Lei 161/2022 que está tramitando na Câmara Municipal de Niterói aponta um modelo de cidade que não está de acordo com a proposta de uma cidade verde e sustentável, pois prevê o adensamento com verticalização, com aumento de população, sem solução para problemas da infraestrutura urbana existente.
Por isso, os coletivos organizados e associações criaram um abaixo-assinado (link) em dezembro de 2022 e que já conta com mais de mil assinaturas e solicita as seguintes reivindicações:
1) Preservação total das áreas úmidas, ainda não edificadas no entorno das lagoas.
2) Gabarito de residência unifamiliar para as Comunidades da Ciclovia e Barreira de Piratininga.
3) Proteção permanente aos Sambaquis de Camboinhas, Sítio Arqueológico Duna Pequena e demais sítios arqueológicos de Niterói.
4) Elaboração de Plano Municipal de Saneamento Básico e de um Plano Municipal de Mobilidade Urbana Sustentável, ambos aprovados pela Câmara Municipal, antes da apresentação de um Projeto de Lei de Uso do Solo.
Uma resposta para “FAKE NEWS SÃO DA PREFEITURA”
Excelente artigo. Esses prédios na FMP da lagoa de Itaipu são um absurdo, área úmida, ecologicamente frágil.